terça-feira, 26 de janeiro de 2021

Dívida

Escolho homenagear esse buraco dilacerado que você deixou em mim. Assim, despedaçada, um monte de coisas pequenas e frágeis, de uma tristeza que o vento não leva porque é leviano. Isso, esse resto, anda por aí, imitando algo que parece gente, mas se arrasta, repete, por vezes até ri, só desespero. Sentir-me assim, viver não, existir assim covardemente, sem pegar a putamerda da vida pelos cabelos é a escolha que não cesso de fazer. Para que serve? Serve para quem eu escolhi homenagear. A cada desistência, procrastinação, corpo jogado esperando um novo (e sempre o mesmo) senhor para servir é o que eu continuo escolhendo. Deixar ir, o buraco não, esse é meu e ninguém tasca, mas permitir que ele possa ser preenchido e esvaziado, preenchido e esvaziado, deixar ele pulsar e permitir que a oferenda aos mortos seja dada como despedida, sepultada por fim...dar adeus, caminar sin pensamientos. Permitir que o prazer possa fazer do meu corpo festa, beleza, amorosidade. É só isso. Abrir mão, deixar ir e ser. Difícil é desejar sem pagar a dívida.