segunda-feira, 6 de maio de 2013

Semiponto

Primeiro sobrenome, depois nome. Pais apoderados da nomeação do outro. Difícil operação, pior que o parto em si. Dias, semanas, meses de angústia sem nome, por um nome. Pariram, enfim, uma menina com sobrenome duplo, herança familiar. Em seguida, o desafio do começo: Thais e...que tal Paula? Disputas e dúvidas, solucionadas pela resposta das ordens inversas:  Paula Thais Avila do Nascimento. Por dezenove anos vive assim, portadora de um quarteto prolixo. Um encontro é suficiente para reduzi-la à Pepa. Rebatizada, subjetividade renascida. Território estável, confortável e previsível. O tédio é inimigo implacável e corrompe a marola dos dias. Advém um cataclismo.  Vento destruidor que carrega cada letra e sentido. Significados perdidos, liquidificados. Sobram fluidos, quase nada. Substância inerte, carregada ao sabor do predito. Flerte com a dissolução definitiva. Resta uma possibilidade. Esperança? Já morreu e esqueceram de enterrar. Não, nada disso. Surge o salvador, sim ele, o único redentor: o amor. Só o amor salva e cura. Força criadora, fertilizadora de terras áridas e poder germinativo da vida. Broto de dupla, casal de dois, soma de distintos. Novo batismo e ganha um ponto, P. Lê-se assim mesmo: pê ponto. Letra P, suficientemente descritiva no singular, acompanhado de ponto final. E chega. A história não acaba, apenas começa. Sempre à mercê da nomeação alheia, subjetividade emprestada. Triste, percebe-se nada. Aquilo que teve nome, sobrenome, apelido e rubrica. Povoada por tantos desejos, destituída de todo e qualquer um. Do silêncio da angústia nasce, devagarinho, um outro possível. Uma outra, na verdade. Em território desconhecido, tímida como o sol  ao amanhecer. No horizonte vê-se um ponto em crescente. Um semiponto.

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